Tosse, dor no peito, dores de cabeça, tontura, vômito. Estes são alguns dos sintomas da criptococose, conhecida como “Doença do Pombo”, que causou a morte da atendente de loja Sandra Silveira Bezerra, de 49 anos, na última quarta-feira (15) no Pronto-Socorro de Rio Branco. Sandra ficou internada na unidade de saúde por uma semana.
A vítima recebeu o diagnóstico na terça (14). Na certidão de óbito consta que Sandra faleceu de meningite fúngica, criptococose, edema cerebral e pneumonia. Ela trabalhou por mais de 12 anos em uma loja de variedades que fica na Rua Cel. Alexandrino, bairro Bosque, na capital acreana, localidade onde há a presença constante de pombos.
A equipe de reportagem conversou com a médica infectolosta Cirley Lobato para saber mais sobre a doença causada por um fungo presente nas fezes dos pombos.
“É causada quando a pessoa inala os poros do fungo, chamados criptococos, e, nesse momento, vai para o pulmão. Inicialmente, o paciente pode apresentar um quadro de pneumonia, uma gripe, que se confunde com muita coisa. Como a doença do pombo não é tão frequente, o diagnóstico é mais difícil”, contou.
A especialista explicou também que o fungo pode entrar na circulação sanguínea do paciente e atingir o cérebro, causando um quadro de meningite com dor de cabeça intensa. Sandra começou a passar mal no final do mês de setembro com tontura. Em outubro, passou a sentir muita fraqueza, tosse e dificuldades para respirar.
Sandra Silveira morreu nessa quarta-feira (15) no Pronto Socorro de Rio Branco — Foto: Arquivo pessoal
“É uma dor de cabeça intensa que não passa com medicação para dor, como dipirona, paracetamol, vômitos e pode ter alteração de consciência. Infelizmente, pode evoluir para a morte e ter sequelas. Para eu fazer o diagnóstico de um agravo, tenho que pensar neste agravo. Como não é uma doença tão frequente, e muitas vezes atinge com quadros mais graves, pessoas que têm alguma imunossupressão, não pensado logo nisso”, ressaltou.
A infectologista destaca também que, em pessoas sem comorbidades, a primeira avaliação leva a crer em um quadro de Covid, gripe, tuberculose, pneumonia e até meningite.
“O paciente vai evoluindo, vem um quadro mais grave e aí que se pensa em um quadro do fungo. É importante no diagnóstico a epidemiologia, descobrir o que o paciente faz, onde estava, se tem a presença ou de local. Sempre falo que o pombo não é o mal, ele traz o mal porque o fungo está nas fezes do pombo”, lamentou.
Exame detectou a presença do fungo Cryptococcus no organismo de Sandra Silveira — Foto: Reprodução
Cuidados
Cirley explicou quais cuidados são necessários para evitar o contato com o fungos. Ele orientou a população a não alimentar as aves para evitar a presença delas nos locais.
“Não exterminar os pombos, tem que ter cuidado quando estiver manuseando as fezes do pombo, tem que lavar bem com água, sabão, o cloro consegue eliminar bem os poros, usar máscaras e luvas quando estiver manuseando este material”, orientou.
Diante de qualquer sintoma, a pessoa precisa procurar uma unidade de saúde. “Geralmente, tratam como uma pneumonia. Se não melhorar, volte ao profissional de saúde para se fazer uma investigação melhor. Começa a apresentar dor intensa na região da nuca, vômito forte. Procure o atendimento médico porque existe tratamento”, disse.
Sandra Silveira com as filhas, Fábia Rodrigues, de 31 anos, e Rebeca Silveira Lopes, de 20 — Foto: Arquivo pessoal
Diagnóstico
Em outubro, Sandra foi levada à Unidade de Pronto Atendimento (UPA), fez um raio-X e foi detectada uma mancha em seu pulmão. Foi então que a filha mais velha levou Sandra em um pneumologista para exames mais específicos.
Ela ficou na UPA do 2º Distrito até dia 8 de novembro, quando foi transferida para o pronto-socorro. Na unidade de saúde, segundo Fábia Rodrigues, filha da atendente, fizeram um exame para meningite e a atendente começou a tomar antibióticos.
“Só pensaram na meningite bacteriana e a viral, não pensaram na fúngica. Foi tomando o antibiótico, mas não havia melhora. Foi para as dosagens mais altas dos antibióticos, a dor de cabeça só piorava, a infecção muito forte também. Houve uma demora muito grande para se descobrir. Fui atrás várias vezes. Ela também teve alterações na visão. O médico explicou que por conta do edema cerebral ocorria essa alteração na visão, mas que quando desinchasse voltaria ao normal”, disse.
O diagnóstico certo foi descoberto apenas na última terça-feira (14), quando Fábia pegou o resultado do exame feito em Sandra no laboratório e apresentou para o médico plantonista. A jovem conta que sempre desconfiou que a mãe tinha doença do pombo devido à presença das aves próximo ao local do trabalho dela.
“Um médico chegou para fazer visita e falei que tinha a suspeita da doença do pombo. Ele me deu uma autorização para eu ir no laboratório buscar o exame. Peguei e levei pra ele. Quando viu, falou que realmente era a doença do pombo. Disse que foram encontradas criptococoses e entraria com a medicação antifúngica”, explicou.
Sandra estava internada na observação do PS quando descobriram a doença. Para tomar a medicação, ela precisava ser transferida para uma enfermaria do andar de cima. Essa transferência foi feita no início da noite de terça, mas a atendente passou muito mal e precisou ser intubada.
“O cérebro dela estava muito inchado, por isso sentia muita dor de cabeça. Se os exames tivessem saído mais rápido, fui no laboratório pegar o resultado. Onde ela trabalhava tinha muito pombo, às vezes, ficava lá pela frente aguardando entrar. Ela passava a maior parte do tempo lá. Ainda estou sem chão, agora que consigo falar”, lamentou.
Saúde investiga caso
Depois da morte de Sandra, a Secretaria de Saúde do Acre (Sesacre) emitiu uma nota neste sábado (18) afirmando que o órgão investiga o caso.
No comunicado, o chefe do Departamento de Vigilância em Saúde, Edvan Meneses, disse que o caso foi confirmado por meio de exame no último dia 8 de novembro, e que diversos órgãos estão envolvidos nessa investigação, tais como Núcleo de Zoonoses, Rede Nacional de Vigilância Epidemiológica Hospitalar, Divisão de Vigilância Ambiental e Centro de Referência em Saúde do Trabalhado.
“Antes de qualquer coisa, é necessário destacar que não devemos exterminar ou ter medo dos pombos, são animais sinantrópicos, adaptados ao convívio com os seres humanos a milhares de anos e com importante papel ecológico para o equilíbrio da vida. Todavia é necessário adotar medidas de higiene, controle e manejo para evitar os problemas que podem ser causados por pombos”, complementou.
Com informações G1 Acre