sexta-feira, 26 julho 2024

Em meio a maior enchente da história, prefeita de Brasiléia considera projeto para tirar moradores da parte baixa da cidade

De acordo com a gestora, há moradores de alguns locais da cidade que se recusam a deixar as casas, mesmo com a enchente. É o caso do bairro Leandro Barbosa, onde cerca de 200 pessoas permanecem durante a cheia.

O plano para o período pós-cheia, segundo a prefeita, inclui construir novas residências e conjuntos habitacionais na parte mais alta do município e desocupar a parte baixa, que sempre é coberta por enchentes.

“São cheias seguidas, então, posteriormente, vamos pensar um projeto ousado e tirar essa parte baixa daqui, construir novas casas, novos conjuntos habitacionais para a parte alta da cidade, porque não dá mais. Nós temos bairros como o Leonardo Barbosa, colocamos à disposição da população para retirada, mas teve pessoas que ainda ficaram. Nós temos 200 pessoas lá. Eu mesma fui lá, levamos médico, levamos a equipe de farmácia ambulante para fazer dispensação de remédios, para entregar comida para eles e para garantir o cuidado com a vida”, disse Hassem.

O município superou a marca registrada em 2015, naquela que ficou conhecida como a pior cheia da história da cidade, quando as águas do manancial cobriram 100% da área urbana do local.

O Acre enfrenta uma cheia histórica em 2024. Em todo o estado, 14.476 pessoas estão fora de casa, dentre desabrigados e desalojados, segundo a última atualização nesta quarta-feira (28). Além disto, 17 das 22 cidades acreanas estão em situação de emergência por conta do transbordo de rios e igarapés. Ao menos 23 comunidades indígenas no interior do Acre também sofrem com os efeitos das enchentes.

Repórter Eldérico Silva mostra extensão da enchente em Brasiléia, no interior do Acre

Com mais de 75% da cidade coberta pela água, a cheia em Brasiléia também dificulta o acesso de veículos que levam mantimentos, já que a cidade está isolada por via terrestre.

Segundo a prefeita, no momento, o município conta com doações principalmente de água potável para abastecimento dos abrigos montados. São três mil refeições diárias, incluindo café da manhã, almoço e jantar.

“Ontem terça-feira, 27 nós recebemos mantimentos do estado, mas tão logo chegou, a gente já despachou para essas famílias que estamos abrigando em escolas e para os abrigos oficiais da prefeitura, que são 15. Além de dividir esse suporte, mandando para comunidades ribeirinhas, também da zona rural. Então, quem puder ajudar, e se puder ajudar, nos ajude com mantimentos, com água, com toda a ajuda necessária”, finaliza.

Balseiros se acumulam em ponte coberta por enchente no interior do Acre.

Maior enchente da história

Rio chegou a marca de 15,56 metros às 9h30 desta quarta-feira (28).

O Rio Acre ultrapassou a marca de 15,55 metros e chegou ao maior nível já registrado no trecho que passa por Brasiléia, distante a mais de 230 km da capital Rio Branco. Na medição das 9h30 desta quarta-feira (28), o nível chegou a 15,56 metros.

Moradores fazem fila para aguardar embarcação que faz transporte até Brasiléia.

Com a cidade tomada pelas águas, quase 4 mil pessoas estão desabrigadas ou desalojadas, segundo a prefeitura do município. Os moradores de Brasiléia e de Epitaciolândia, cidade vizinha, fazem filas para aguardar as embarcações que têm feito o transporte de moradores para várias atividades. O comércio, inclusive, não parou de funcionar, nem mesmo com a cheia.

No caso da técnica de enfermagem Odete de Lara, a necessidade de locomoção é por conta do trabalho. Ela veio de Rio Branco para atuar no hospital de Brasiléia.

“Eu estou chegando aqui e vou me apresentar assim que conseguir chegar do outro lado, de canoa, que é a única forma. Para mim é um grande desafio, mas eu vou conseguir chegar lá”, relata.

Técnica de enfermagem aguarda embarcação para chegar a Brasiléia e trabalhar no hospital do município.

Ainda conforme a prefeitura, são 2.968 pessoas desalojadas, ou seja, que precisaram sair de suas casas, e 1 mil desabrigadas. Entre essas pessoas está Maria Lucinele Lene, moradora do bairro Leonardo Barbosa, e que precisou deixar sua casa após a água entrar no local.

Ela está na casa da sogra, e diz que ainda tentou escorrer as águas que entraram na residência, mas a inundação acabou alcançando a janela de sua casa.

“A água começou a chegar por trás, ela veio pelos bueiros. Eu estava em um hospital com a minha filha, aí quem tirou [a água] foram os meus parentes, aí ela [água] começou a chegar. Agora ela tá na janela. Nunca tinha vivido isso. Estou na casa da minha sogra, toda a família está lá. E todo ano a gente pensa que vai acontecer de novo”, conta.

Conforme a cheia avança pela cidade, um gabinete de crise foi instalado e as pessoas atingidas começaram a ser cadastradas para receberem assistência. E a esperança de Maria Lucilene é exatamente essa: que os moradores afetados pela enchente recebam a devida atenção, e que possam voltar para casa.

“A gente já vai ficar naquele medo. Eu espero não sei nem o que. Pelo menos uma melhoria para a gente, se as pessoas olharem mais para a gente, para aquele bairro, que é um bairro de risco. Eu espero voltar para minha casa”, pede.

“A gente já vai ficar naquele medo. Eu espero não sei nem o que”, diz moradora que teve casa atingida por enchente em Brasiléia.

O coordenador do gabinete e subcomandante do Corpo de Bombeiros do Acre, coronel Eden Santos, ressalta que a resposta à emergência já está sendo posta em prática, mesmo diante da extensão da cheia, que dificulta os trabalhos.

“Todo o poder de resposta está atuando para poder dar o menor impacto para a nossa população. No intervalo de tempo muito curto de operações, nós temos já cerca de 75% da cidade de Brasileia em inundação. E faz com que o nosso trabalho operativo se complique mais ainda. Quando a gente tem um colapso na passagem da ponte, estamos fazendo diversas intervenções de segurança para não ter problema de colapso também no sistema de abastecimento e também energético aqui na região de Brasiléia. Todo o poder de resposta, Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Polícia Civil. Todos os organismos de resposta aqui têm atuado de forma íntegra. Todo mundo coeso, buscando sempre o melhor para o atendimento dessas famílias”, destaca.

Colaborou o repórter Eldérico Silva, da Rede Amazônica Acre.

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